Trabalho escravo
BAHIA: MTE resgata 57 trabalhadores de situação análoga à escravidão nos municípios de Gentio do Ouro e Várzea Nova
Fonte: Fonte: Com informações do site gov.br
20/06/2025
Foto: Arquivo MTE
Durante operação de fiscalização realizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), por meio da Inspeção do Trabalho, 57 trabalhadores em situação análoga à escravidão foram resgatados entre os dias 8 e 18 de junho. Os resgates ocorreram em fazendas de carnaúba e sisal na zona rural dos municípios de Várzea Nova e Gentio do Ouro, na Bahia. A ação contou com o apoio do Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério Público Federal (MPF), Defensoria Pública da União (DPU) e Polícia Federal (PF).
Segundo a equipe de fiscalização, os trabalhadores encontrados nas plantações de carnaúba e sisal estavam submetidos a condições precárias tanto na moradia quanto no ambiente de trabalho, configurando um cenário desumano. Na fazenda localizada em Gentio do Ouro, foram resgatados 42 trabalhadores. No local, foram identificados quatro alojamentos distintos, todos em condições degradantes. Em um deles, os trabalhadores dormiam em redes trazidas por conta própria, penduradas na varanda aberta de um comércio vizinho, sem paredes ou divisórias. As redes estavam armadas entre colunas, apoiadas sobre sacarias de sisal, caixas de bebidas alcoólicas, botijões de gás e diversos utensílios, em meio a materiais armazenados e resíduos.
Nenhum dos alojamentos contava com móveis ou espaços adequados para guardar pertences, e as redes de dormir se espalhavam por corredores, cozinha e áreas externas. Não havia banheiros nem infraestrutura adequada para higiene pessoal. Em todos os casos, as condições apresentavam grave precariedade física, sanitária e social, agravada pelo calor excessivo, umidade, insalubridade, falta de privacidade e exposição a riscos biológicos. A água consumida era armazenada em galões que antes continham produtos químicos usados no manejo da carnaúba, substâncias altamente corrosivas. Os trabalhadores dormiam em redes improvisadas entre colunas, apoiadas sobre sacarias de sisal, caixas de bebidas alcoólicas, botijões de gás e outros objetos. Sem calçados adequados, improvisavam sacos plásticos nos pés para trabalhar.
No município de Várzea Nova, 15 trabalhadores foram resgatados em uma fazenda de sisal. Conforme a fiscalização, o pagamento semanal era de R$ 250, valor muito inferior ao salário mínimo vigente, que atualmente é de R$ 1.518. Os trabalhadores operavam máquinas perigosas sem o uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e, frequentemente, estavam descalços, usando chinelos ou até sacos plásticos amarrados aos pés devido à falta de calçados adequados. Um dos trabalhadores relatou ter perdido dois dedos de uma das mãos durante o corte do sisal.
Os alojamentos apresentavam condições igualmente degradantes: não havia colchões, lençóis ou travesseiros. Os trabalhadores dormiam diretamente no chão sujo, sobre pedaços de papelão, restos de espuma, sacos plásticos e panos finos. Assim como nas fazendas de carnaúba, não havia banheiros nem chuveiros; as necessidades fisiológicas eram feitas no mato, e a higiene pessoal, realizada com baldes e canecas no interior dos alojamentos. A água destinada ao consumo era armazenada em recipientes precários, sem vedação ou proteção contra impurezas, animais e resíduos, o que, segundo relatos dos trabalhadores, causou mal-estar em vários deles. Além disso, o local não possuía energia elétrica nem abastecimento de água encanada. Os alimentos eram guardados diretamente no chão, e as refeições se limitavam a arroz, cuscuz e feijão. Quando havia carne, esta era pendurada acima do fogão, exposta a moscas e outros insetos.
A equipe de fiscalização informou que os responsáveis pelas fazendas foram notificados a regularizar os vínculos trabalhistas, quitar as verbas rescisórias e realizar o recolhimento do FGTS e das contribuições sociais. O montante das verbas rescisórias atingiu cerca de R$ 380.000,00, valor que foi pago parcialmente. Além disso, foram firmados Termos de Ajuste de Conduta (TACs) com o Ministério Público do Trabalho (MPT) e a Defensoria Pública da União (DPU), estabelecendo o pagamento das verbas rescisórias restantes e indenizações por danos morais individuais a cada trabalhador.
Atendimento dos Trabalhadores e Projeto Vida Pós Resgate
Os trabalhadores resgatados têm direito a receber três parcelas do seguro-desemprego especial e foram encaminhados aos órgãos municipais e estaduais de assistência social para atendimento prioritário. Durante a operação, auditores-fiscais do Trabalho realizaram entrevistas e aplicaram questionários para identificar as condições de vida e as aspirações futuras dos trabalhadores. Foi avaliada a possibilidade de inserção desses trabalhadores no Projeto Vida Pós Resgate, coordenado pela Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro), vinculada ao MTE. O projeto apoia a formação de associações rurais de trabalhadores resgatados em seus locais de origem, incentivando a produção de alimentos saudáveis. Além disso, oferece suporte material — como equipamentos, máquinas e insumos — e assistência técnica, jurídica e de capacitação, auxiliando os associados a administrar suas próprias entidades.
No dia 16 de junho, ocorreu a primeira reunião entre os trabalhadores interessados em formar uma associação rural e representantes do Projeto Vida Pós Resgate. Durante o encontro, foram apresentados e debatidos os principais aspectos do projeto, incluindo a metodologia de apoio às associações, às atividades produtivas possíveis e as alternativas de distribuição. Considerando o interesse demonstrado e o perfil dos trabalhadores, decidiu-se pelo aprofundamento imediato do diálogo para viabilizar a criação de mais uma associação apoiada pelo projeto.